sábado, 18 de julho de 2009

Conhecimentos de Psicologia usados em Psicologia Escolar

Fui convidada a dar uma palestra sobre minha atividade profissional outro dia e não planejei a aula, o que se mostrou uma ótima estratégia. Os alunos me mostraram coisas que eu precisava saber que sabia.
Quais são os conhecimentos de psicologia usados pelo psicólogo escolar; quais são as ações típicas do psicólogo escolar; diferença de atuação entre orientador educacional e psicólogo escolar; angústias da profissão; ansiedades da equipe escolar em relação ao nosso trabalho.
Todas estas questões são interessantes para desenvolver aqui neste espaço. É bom acrescentar que pretendo fazer umas entrevistas com orientadoras educacionais para fundamentar o texto referente a elas.
Começarei, então, pelo primeiro tópico: quais os conhecimentos da ciência psicológica usados na prática de psicologia escolar.

Muitas vezes, durante o curso de graduação não compreendemos o alcance dos conhecimentos aprendidos em cada matéria; mesmo sendo estes bem mais ligados a prática profissional do que os conhecimentos estudados no segundo grau. A minha idéia foi, então, motivar os alunos para suas matérias básicas.

Psicologia da aprendizagem: como cada teórico apresenta a forma que os humanos e não humanos aprendem; diferenças entre as espécies; o papel dos estímulos; momentos mais propícios para se apresentar um novo conceito. Esse conjunto de teorias pode ser utilizado em clínica, empresas, escolas. No nosso ambiente em especial, além das diferentes abordagens teóricas, ainda considero as diferenças interindividuais. Tolstoi, melhorando um antigo dito popular, afirmou em seu clássico Anna Karenina “se é verdade que cada cabeça uma sentença, há de haver tantas maneiras de amar quantos os corações.” Seguindo este raciocínio, há muitas formas de aprender algo. E as professoras já descobriram isso há bastante tempo também. Existem casos em que a profissional de sala de aula não percebe de que forma pode apresentar um assunto a determinado aluno e neste momento o psicólogo escolar pode lhe ser bastante útil. Alguns momentos com a criança, particularmente ou na sala de aula, permitem ao psicólogo uma análise de como as informações chegam mais facilmente ao processamento daquele indivíduo. O resultado desse contato deve ser repassado para a professora o mais rápido possível com linguagem acessível e adaptada.
Aqui devemos reter-nos um instante para salientarmos a opção que o psicólogo faz por uma teoria orientadora. As teorias psicogenéticas são básicas para a psicologia da aprendizagem. Porém elas são excludentes. Piaget afirma que a aprendizagem ocorre após o desenvolvimento psicobiológico. Vygotsky propõe que a aprendizagem provoca o desenvolvimento psicológico. Skynner indica que aprendizagem e desenvolvimento são focos distintos para o mesmo fenômeno. É comum, ao conversarmos com uma professora, observar que ela usa instrumentos dessas três teorias simultaneamente de forma muito tranqüila. Acredito ser desnecessário e contraproducente mostrar tais equívocos às professoras. Mas tal ação é aqui censurada e combatida, pois as possibilidades de engano nesta área não são perdoáveis, posto nossa esperada especialidade no assunto. As ações do psicólogo devem ser coerentes com a teoria que escolheu para orientar-se e quanto mais seriamente considerar isso, melhores resultados obterá o profissional. As teorias que utilizamos se apresentam em nosso discurso oral, relatórios, explicações de comportamento e aprendizagem, orientações a profissionais e pais, contato direto com o aluno. Teorias embasam ação (prática). Não é possível pensar uma coisa diferente para cada ação. Não há coerência nesta conduta e os profissionais que acompanham nosso trabalho percebem rapidamente esse problema. A confiança em nosso trabalho pode ser impactada por essa ação. E a falta de confiança em um psicólogo tem impacto sobre toda a nossa classe profissional.

Psicologia organizacional: quando participamos de uma escola, podemos auxiliar o corpo diretor da instituição em relação à administração (vide Parcerias para o trabalho em Psicologia Escolar, neste blog). Conhecimentos de comunicação, relações humanas, ergonomia, planejamento espacial (psicologia ambiental) são muito úteis apesar de inesperados. Como o perfil do psicólogo escolar não é conhecido dos demais profissionais da escola, nosso potencial auxílio institucional deve ser oferecido aos líderes/dirigentes.

Psicologia de grupo e dinâmica de grupo: conhecimento muito útil para se perceber a dinâmica institucional. Quem são os líderes positivos e negativos, quais são os elementos chave que podem ser considerados ao se implantar novos projetos, quem compreende a dinâmica da escola, quem conhece a história da escola e, o mais importante, quais são as formas de auxiliar a instituição considerando seus próprios membros. O trabalho pode ser desenvolvido com o grupo de professores, direção, alunos, profissionais de manutenção e limpeza, merendeiros, pais, famílias ou ainda todos os profissionais da escola em conjunto.

Psicologia comunitária: análise de elementos valorizados pela comunidade atendida, pontos críticos e potencial humano não desenvolvido são conhecimentos desta área que também embasam o trabalho do psicólogo escolar e podem auxiliar em suas intervenções com a família.

Psicologia clínica: como dito em postagem anterior (Acolher o problema), o treinamento em clínica instrumentaliza o psicólogo com a sua principal ferramenta, a que eu acredito ser o diferencial mais significativo entre os demais profissionais: a escuta clínica. A ligação de elementos do discurso do sujeito com sua demanda possibilita soluções não antevistas por ele. O acolhimento, a aceitação incondicional ao sujeito, a postura de confiabilidade que aprendemos na clínica são fundamentais para nossa caracterização profissional. E estes são elementos que podem ser usados na escola para iniciar um atendimento.

Aconselhamento psicológico: neste ponto temos nossa interseção com a orientação educacional da qual falaremos mais pormenorizadamente em próxima postagem. Por ora podemos dizer que em aconselhamento aprendemos a devolver, em poucas sessões, alternativas de ação para um sujeito que se mostra perdido individualmente. Esta ação se aproxima da orientação devido a sua posição diretiva e assertiva que convida o sujeito em atendimento a movimentar-se, caso esteja paralisado; dirigir-se, caso não saiba que posição tomar; acalmar-se, caso mostre agitação alienante, por exemplo. Estas ferramentas são muito utilizadas para o atendimento de pais.

Psicologia do desenvolvimento: a forma como os seres humanos se desenvolvem é o objetivo desta seção da psicologia. E o objetivo maior da escola é o desenvolvimento do ser humano integralmente. Todas as ações da escola se dirigem para o maior crescimento de seus alunos. Ela se esforça para que os empecilhos sejam minimizados. Nesse ponto se encontram novamente todos os atores da escola: alunos, pais, profissionais. Há cerca de 50 anos, a psicologia vem [lentamente] se atentando para a continuidade do desenvolvimento para além da adolescência. Apesar do foco principal do psicólogo escolar ser os alunos e seu melhor desempenho global (biológico, familiar, emocional, relacional, intelectual, e.g.), temos uma excelente oportunidade de exercer nossas técnicas para o melhor desenvolvimento dos adultos e idosos envolvidos com as crianças atendidas. Assim, possibilitamos o crescimento de toda a comunidade escolar sob a luz de conhecimentos técnico-científicos eficazes. O corpo teórico da perspectiva do ciclo de vida apresenta-se como potencialmente útil para este embasamento. Não podemos deixar de apontar, entretanto, as brilhantes contribuições dos teóricos já citados Vygotsky, Piaget, Skinner e de outros como Freud, Wallon, Jung, Erickson, Roger, Reich.

Quais instrumentos usar, como e em que medida serão determinados pela personalidade do psicólogo, pelas características da instituição a qual serve, pelas oportunidades e conhecimento dos instrumentos que possui. Por isso, neste blog sempre me remeto aos estudantes (futuros colegas), para que percebam que durante o curso de graduação estamos nos preparando e ainda não sabemos para quê. Digo isso com segurança porque há uma latência de cinco anos entre o que se aprende e sua aplicação eficaz e nossa sociedade tem mudado bastante ultimamente.

Encerro afirmando que estas são áreas que foram debatidas durante a palestra. Há seções da psicologia que provavelmente auxiliariam o trabalho do psicólogo escolar, porém me escapam da memória ou são deficientes em minha formação (como psicologia da motivação, da criatividade e comunitária).