domingo, 25 de outubro de 2009

Sobre indisciplina coletiva

Um/a leitor/a solicitou auxílio para lidar com sua classe indisciplinada (comentou na postagem “Dinâmica laboral de uma escola”). Agradeço a questão!

Entendo que todo o comportamento pode ser interpretado como uma forma de comunicação. Assim, a indisciplina dos alunos indica um desconforto com alguma coisa. Se ela está muito relacionada com a violência, então apresenta o principal perfil da nossa sociedade atual.

O avanço da violência que percebemos hoje em todos os níveis de relacionamento entre humanos aponta para um modelo. Eu penso que a principal raiz deste modelo está nas produções audio-visuais que consumimos. Um dos diretores mais famosos e valorizados é Quentin Tarantino. Ele afirma que a câmera cinematográfica foi inventada para fotografar a violência. Filmes de longa-metragem para cinema ou televisão, seriados, desenhos animados são realizados com base em relações violentas. Produções que não apontam conflito não geram bilheteria e são sem graça. Esta cultura de agressividade tem chegado às músicas e o sucesso dos raps entre adolescentes mostram isto. Nossos telejornais também mostram esta preferência. Há jornais escritos que são classificados pela metáfora: quando torcemos este jornal, pinga sangue. Os mortos são fotografados e apresentados sem pudor algum e os jornais são consumidos vorazmente.

Não podemos esperar que as crianças apresentem comportamentos diferentes dos que elas presenciam em casa, nas novelas, nos filmes, nos desenhos. Que tipo de expressão afetiva elas mostrarão senão aprendem nada diferente? A violência e o desrespeito são valorizados socialmente em seus mínimos gestos.

Nossos alunos mais violentos são tratados com outro tipo de afeto. Uma vez me surpreendi com minha reação agressiva frente a um aluno e sua mãe. Ele gritava comigo e com sua mãe, recusando tudo o que lhe oferecíamos. Ela bateu nele duas vezes na minha frente. Após perceber a minha própria reação e com a saída da mãe por alguns instantes, toquei o braço do aluno com delicadeza e falei-lhe bem baixinho e com doçura. Ele então aceitou um copo d’água que lhe ofereci, andamos um pouco até o bebedouro para que ele respirasse melhor, aguardei que bebesse a água, dispensei a mãe e comecei a conversar com ele informando quais eram meus objetivos, proposta de trabalho e exemplo de um caso bem sucedido que ele conhecia. Desde então, sua extrema reatividade acabou.

Com este exemplo procuro mostrar que há casos em que o/a aluno/a não sabe outra forma de expressar-se. Como sempre é incompreendido quando está agitado, não percebe que pode mudar pequenas coisas e, consequentemente, transformar a reação dos outros em relação a si mesmo. Na verdade, muitos de nós, mesmo adultos, não percebemos isto.

Minha sugestão para tratar uma turma inteira indisciplinada é conversar com todos de forma que eles/as possam se olhar e se ouvir. Eles/as devem entender que a desorganização é prejudicial a todos e responsabilidade deles/as também. O silêncio é feito por cada um e cada um deve responder pelo seu silêncio.

É necessário dar a palavra ao/às alunos/as. Eles/as apresentam excelentes alternativas de solução de problemas. Apostemos nas idéias das novas gerações. Ninguém melhor do que nossos alunos/as se conhecem, individualmente e em grupo. Eles/as sabem quem faz mais bagunça, pois estão atentos para a diferença da turma quando alguém falta à aula. Valorizemos suas idéias, sua comunicação oral, facial e gestual. Devemos oferecer alternativas de comunicação para os pequenos. Conhecer suas famílias e entender como se relacionam e comunicam para melhor compreendê-los e, assim, educá-los.

Também é importante que eles/as saibam que estão sendo agressivos oral, facial e gestualmente e o quanto isto é ruim para nós. Esta conversa especificamente deve ser individual para que não se posicionem contra nós perante a turma de modo a se fortalecerem, o que é bastante valorizado socialmente entre os/as alunos/as.

Espero que a pessoa que suscitou esta postagem tenha tido acesso a ela e que a tenha atendido. Caso não tenha surtido efeito, solicito que indique pormenores para que eu possa ser mais específica. Se preferir, envie e-mail para mim diretamente: vicenzacapone@hotmail.com e ficarei feliz em auxiliar.